Campo Formoso marca presença no I Seminário Internacional de Educação Quilombola e fortalece a luta por educação e território quilombola em nível nacional



O I Seminário Internacional de Educação Quilombola e suas Confluências, realizado em Recife entre 21 e 24 de outubro de 2025, reuniu lideranças quilombolas, educadores(as), pesquisadores(as), ministérios do governo federal, universidades e representações internacionais para afirmar a educação escolar quilombola como política de Estado, direito coletivo e instrumento de justiça social. O encontro teve organização do Ministério da Educação, por meio da SECADI e da Diretoria de Políticas para a Educação Étnico-Racial e Educação Escolar Quilombola (DIPERQ), em articulação com o Ministério da Igualdade Racial, a CONAQ e instituições de ensino superior.

A abertura do evento foi marcada por falas políticas e apresentações culturais que colocaram a ancestralidade, a espiritualidade e a identidade quilombola no centro do debate educacional. Lideranças de diferentes estados, professores(as), estudantes e integrantes de movimentos quilombolas destacaram que a educação quilombola não é apenas acesso à escola, mas permanência nos territórios, fortalecimento da memória e garantia de dignidade coletiva. A participação virtual de Givânia Silva reforçou que essa luta é histórica e segue viva dentro e fora dos quilombos.

Durante o seminário, o Ministério da Educação reafirmou o compromisso com a Política Nacional de Equidade, Educação para as Relações Étnico-Raciais e Educação Escolar Quilombola (PNEERQ), instituída em 2024, e anunciou medidas para sua consolidação. Entre elas, o PDDE Equidade e o PDDE ERER, voltados ao enfrentamento do racismo nas escolas, a ampliação de cursos de licenciatura em Educação Escolar Quilombola e o ajuste no fator de ponderação do Fundeb para garantir financiamento específico às escolas em território quilombola.

O encontro também destacou o fortalecimento da participação quilombola em espaços de decisão. Foi mencionada a indicação do nome da professora Giovanna Maria da Silva para ocupar uma cadeira no Conselho Nacional de Educação o que representa um marco simbólico e prático para a presença quilombola na formulação de políticas públicas. A Comissão Nacional de Educação Escolar Quilombola (CONEEQ), com representantes de todas as regiões do país, também foi reafirmada como espaço permanente de monitoramento e cobrança.

Campo Formoso, na Bahia, esteve representado pelo membro do coletivo de educação da CONAQ e gerente de educação escolar quilombola do município, professor Rodrigo Vicente. Ele participou das discussões sobre currículo, financiamento e permanência estudantil em territórios quilombolas, trazendo a experiência local como exemplo de que a política nacional precisa dialogar diretamente com a realidade das comunidades. Segundo ele, a agenda da educação quilombola “não pode ser tratada como projeto complementar. Ela é central para garantir que nossas crianças aprendam sem abrir mão de quem são”. A presença de gestores municipais como Rodrigo reforçou o caráter federativo do debate, aproximando as decisões nacionais da prática cotidiana nas redes de ensino.

A programação incluiu mesas temáticas, rodas de diálogo e vivências territoriais. No segundo dia, as discussões focaram na relação indissociável entre direito à educação e direito ao território, articulando a PNEERQ ao Plano Nacional de Gestão Territorial e Ambiental Quilombola (PNGTAQ). Representantes do Ministério da Igualdade Racial, da SECADI/MEC e da CONAQ defenderam que não há escola quilombola plena em território ameaçado. O debate contou ainda com conferencistas de Honduras, Colômbia e Equador, que apresentaram paralelos entre as lutas quilombolas e afrodescendentes na América Latina.

O terceiro dia do seminário ocorreu diretamente nos territórios quilombolas de Pernambuco, incluindo Trigueiros, Onze Negras, Povoação de São Lourenço, Terreiro Xambá e Povoado Demanda/Engenho Siqueira. Nessas comunidades, gestores(as), professores(as), pesquisadores(as) e estudantes discutiram transporte escolar, infraestrutura, currículo, memória e proteção cultural a partir da realidade concreta dos quilombos. Para participantes, levar o seminário para dentro do território foi uma forma de afirmar que a política pública precisa nascer da escuta direta das comunidades e não apenas de gabinete.

Entre os desafios apontados pelos participantes, esteve a não realização das salas temáticas, que seriam espaços de aprofundamento técnico sobre temas como formação docente, gestão escolar e financiamento. Também houve alerta quanto à necessidade de garantir que os recursos anunciados pelo governo federal cheguem, de forma contínua, às escolas quilombolas nas redes municipais e estaduais. Para o professor Rodrigo Vicente, esse é um ponto sensível para municípios: “Sem orçamento carimbado, a escola quilombola fica dependendo de boa vontade política. E direito não pode depender de favor”.

O evento foi encerrado com a roda de confluência “vamos falar de nós ganhando: Educação Escolar Quilombola nas Regiões do Brasil” e com a leitura e aprovação da carta final do seminário. O documento reúne diretrizes e compromissos que deverão orientar a cobrança de políticas educacionais em nível federal, estadual e municipal.

Com forte presença de mulheres quilombolas, juventudes e lideranças tradicionais, o I Seminário Internacional de Educação Quilombola e suas Confluências registrou que a educação quilombola é, ao mesmo tempo, política de equidade racial, afirmação identitária e soberania territorial. A avaliação coletiva é que o encontro não foi um ponto de chegada, e sim um ponto de partida para uma atuação articulada entre governo e movimento quilombola — do nível nacional até municípios como Campo Formoso.


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